Aprovação de certificados de calibração e limites de erro permissíveis – uma abordagem por processo
Não é raro encontrar no meio da Qualidade ou Instrumentação quem se preocupe muito com o certificado de calibração, ou com a calibração que está vencendo em determinada data, sempre com o foco de passar em alguma avaliação ou auditoria. Mas será que apenas o certificado de calibração garante a confiabilidade do processo?
Não teremos aqui a pretensão de tornar a resposta para esta pergunta num simples “sim” ou “não”, mas levar a uma abordagem que possa direcionar o leitor a um caminho mais seguro na busca pela resposta.
Em alguns casos nos deparamos com a situação de somente pensar em calibração dos instrumentos quando estamos próximos de um processo de auditoria, seja por um cliente ou por um órgão certificador. Apenas o certificado de calibração sem uma análise mais sistêmica não assegura a adequação a um processo de avaliação, tão pouco assegura um nível de qualidade elevado ao seu produto. Certifica apenas que seu equipamento foi comparado contra um padrão de referência.
A correta aplicação de técnicas estatísticas e uma análise baseada em normas podem ajudar a tornar a metrologia um gerador de receitas para a empresa. Nisso a metrologia contribui muito, dando confiabilidade, economia e velocidade ao seu processo, através da queda de retrabalho, evitando perdas de matéria prima e elevando o nível de qualidade percebida pelo seu cliente.
Em outro aspecto, agora olhando para os ativos da empresa, a calibração garante a rentabilidade e produtividade, aumento da vida útil do parque produtivo, com maior volume de horas de produção por máquina e menor volume de estoque de peças de reposição.
Passo a passo
Para obter êxito nesta empreitada, é necessário que se cumpra uma série de etapas para estabelecer um plano metrológico consistente e que irá dar calço para o plano de calibrações.
No primeiro momento precisamos verificar qual é o tamanho do parque de instrumentos que temos por área e deles definir quais são impactantes no processo, seja por criticidade na qualidade final do produto, por alguma exigência normativa ou ainda por redução de custos ou desperdícios. Todos os equipamentos que constarem do plano metrológico deverão ser submetidos à calibração periódica. A figura a seguir mostra um exemplo de tabela para se montar um plano metrológico.
Imagem 1 – Exemplo de plano metrológico
Como se nota, é necessário que se levante criteriosamente cada equipamento do processo.
Feito o levantamento passa-se a descrever a unidade de medida envolvida e a resolução (divisão de leitura) do instrumento, após é preciso que se estude em conjunto com a engenharia de processo ou com a gerência de produção, o quanto cada etapa produtiva possui de tolerância, o que se traduz na verdade em o quanto o processo produtivo pode variar sem causar problemas no produto, queda de qualidade ou perda de matéria prima/retrabalho.
Esta etapa é a mais complexa e demorada, pois exige muito alinhamento entre os departamentos da organização, um bom nível de entendimento do objetivo que se pretende alcançar e uma abordagem criteriosa para cada caso.
Existem equipamentos que servem a diversos processos dentro de uma empresa, como no caso de medição de temperatura por exemplo. Tomando como base uma indústria de alimentos, um termômetro pode servir para monitorar um circuito de refrigeração em compressores de amônia e outro termômetro de mesma capacidade pode ser usado para monitorar a temperatura do produto acabado. Ou em um processo de produção de fármacos pode-se monitorar a pressão de uma linha de líquidos e um manômetro semelhante para monitorar a pressão de uma autoclave no processo de higienização de insumos.
Vemos que são instrumentos semelhantes, mas que estão sendo usados em processos muito distintos. Como adotar um único campo de tolerância neste caso?
Podem-se seguir dois caminhos: criar tolerâncias por processos, ou adotar a tolerância do processo mais criterioso.
No primeiro caso, tem-se um resultado mais próximo da realidade de cada equipamento, porém o volume de documentos e informações tratadas é muito maior, o que pode levar a desencontros entre o que está descrito no plano e o que realmente se verifica na prática do processo. Já no segundo caso, adotando tolerâncias por processo mais critico, o volume de informações descritas é sensivelmente menor, mas corre-se o risco de se estreitar tanto o critério que irá prejudicar a análise de um processo um pouco mais grosseiro.
Como se vê, não é tarefa para apenas uma pessoa nem para apenas um departamento da empresa, é necessária uma abordagem mais abrangente e holística do processo.
Vencida esta etapa, passe-se a tratar os dados colhidos para se chegar ao campo de tolerâncias, que nada mais é do que a amplitude total da tolerância de processo e que servirá de base para a próxima tarefa, que é a determinação do limite de erro permissível.
Tomando como base a tabela anterior, vamos analisar o caso que se refere ao termômetro.
Para o efeito de exemplo tomamos como referencia que este termômetro opera em um processo de medição com valor de 120°C e que a tolerância do processo é de ± 5°C.
Passamos então a adotar 1/3 da tolerância do processo (amplitude) para determinar o limite de erro permissível:
Encontrado o valor de limite de erro permissível, este servira de parâmetro para a comparação com o resultado da medição expresso no certificado de calibração do equipamento que é a soma do valor de erro encontrado no processo de medição mais a incerteza de medição atribuída a este mesmo processo.
Se o valor do resultado da medição for menor ou igual ao limite de erro permissível o certificado de calibração está aprovado e por consequência o equipamento pode ser liberado para uso no processo.
No caso de o resultado da medição estar maior que o limite de erro permissível, o equipamento deve ser levado ao ajuste para corrigir o erro de leitura e poder atender corretamente a necessidade do processo em que atua. A operação de ajuste nem sempre é executada por laboratório de metrologia, sendo muitas vezes recomendado que o próprio fabricante proceda com o ajuste, assegurando os níveis de exatidão requeridos conforme especificação de fábrica ou em casos mais extremos é indicada uma intervenção de reparo pelo mesmo fabricante para colocar o equipamento de medição novamente em conformidade.
Conclusão:
Em linhas gerais, executando alguns dos passos aqui expostos, consegue-se demonstrar nas avaliações de clientes e organismos certificadores uma consistência no plano metrológico que vai muito além de mostrar apenas o certificado de calibração, pois se leva em conta a aplicação do equipamento de medição e o processo ao qual o mesmo está inserido.
Complementando esta sistemática, é bastante recomendável que se implante a norma , que versa sobre requisitos genéricos e fornece orientação para a gestão de processos de medição e comprovação metrológica de equipamento de medição usado para dar suporte e demonstrar conformidade com requisitos metrológicos. Ela especifica requisitos de gestão da qualidade de um sistema de gestão de medição que pode ser usado por uma organização que executa medições como parte de um sistema de gestão global, e para assegurar que os requisitos metrológicos são atendidos.