Gateway para comunicação sem fio em redes Modbus RTU
É evidente o crescimento da oferta e aceitação de redes sem fio (wireless) no meio industrial. Questões como confiabilidade, segurança, latência e determinismo são diferentemente abordadas por protocolos sem fio como Wireless HART, ISA 100.11a, ZigBee, entre tantos outros. Estes protocolos enquadram-se numa categoria mais ampla denominada “Redes de Sensores Sem Fio” e há grande quantidade de material publicado e produtos já disponíveis nesta categoria de redes de sensores sem fio.
O padrão elétrico de redes de comunicação cabeada mais difundido na área de manufatura industrial é o EIA/TIA-485 (RS-485). E nestas redes destaca-se o protocolo Modbus RTU, um protocolo simples e com imensa oferta de produtos em todo o mundo.
A maioria dos conversores de comunicação cabeada para dispositivos sem fio impõem desafios de aplicação com o protocolo Modbus RTU, devido à dificuldade em ajustar os tempos de comunicação. Especialmente em redes que operam produtos de diferentes fabricantes, é muito difícil configurar os conversores para garantir que os pacotes de comunicação Modbus RTU não sejam fracionados durante o processo de comunicação. O fracionamento pode provocar erro de comunicação com alguns dispositivos da rede, aumentando o tráfego com tentativas e causando grande degradação de desempenho.
Este artigo apresenta soluções para a criação de redes ou sub-redes Modbus RTU sem fio facilmente integráveis aos sistemas cabeados baseados neste mesmo protocolo. Para prover a conectividade sem fio é adotado o padrão IEEE 802.15.4, o mesmo utilizado na grande maioria dos sistemas de “Redes de Sensores Sem Fio”. Características inerentes ao protocolo Modbus RTU, como o rígido requisito temporal, formação e delimitação de pacotes, baixa velocidade, número de escravos e mestre único são tratados pelo AirGate-Modbus para garantir a correta operação do protocolo Modbus RTU, mesmo quando operando sem fios.
Criando redes Modbus RTU sem fio
AirGate-Modbus é um gateway que integra redes Modbus RTU sobre RS485 em uma ou mais redes sem fio IEEE 802.15.4. Essa integração é realizada de forma transparente para a rede Modbus, assim possibilitando a simples substituição de longos trechos de cabeamento por segmentos sem fio.
Cada gateway dispõe de três interfaces de comunicação: USB, RS-485 e IEEE 802.15.4. Diferentes arranjos entre as redes cabeadas e sem fio são possíveis, de acordo com a configuração de cada uma destas interfaces.
A interface IEEE 802.15.4 opera em topologia estrela e permite que múltiplas estrelas sejam configuradas, viabilizando a solução de problemas complexos de conectividade sem fio. O gateway utiliza mecanismos internos do padrão IEEE 802.15.4 para garantir a operação da comunicação sem fio mesmo sob interferência de outros dispositivos operando na mesma faixa de frequência. A seleção automática do canal de comunicação (de um total de 16) é feita baseada no mecanismo Energy Detection (detecção da energia) e Quality of Signal (qualidade do sinal), combinados com a taxa de erro na comunicação Modbus RTU sem fio. Este mecanismo promove a troca automática de canal sempre que há queda de desempenho ou qualidade na rede sem fio. A frequência central de operação é de 2,4 GHz, com potência de 20 dBm (100 mW), resultando em um raio de alcance de 1000 m em campo aberto e de cerca de 100 m no interior de edificações (o alcance no interior de edificações depende do número e tipo de obstáculos entre os equipamentos sem fio).
Número máximo de dispositivos na rede RS485
A norma TIA/EIA-485, conhecida popularmente como RS485, não define o número máximo de dispositivos interligados em uma rede. Ela menciona uma série de parâmetros que podem ser utilizados para o cálculo deste limite. Alguns destes parâmetros são os seguintes:
- Limite inferior para a resistência de carga resultante no barramento.
- Valor de resistência que cada dispositivo da rede representa no barramento, denominada “Carga Unitária” (15 kΩ).
- Valor mínimo de corrente que o driver (transmissor) de um dispositivo RS485 deve ser capaz de fornecer.
A partir destes dados, e considerando a necessidade de resistores de terminação nos dois extremos do barramento, pode ser calculado o limite de 32 dispositivos com carga unitária para um barramento de comunicação RS485. Lembrando que recomenda-se a utilização de resistores de terminação de 120 Ω, cujo valor resultante corresponde a 60 Ω.
Atualmente, estão disponíveis equipamentos RS485 com carga inferior à unitária, sendo usuais os valores de 1/2, 1/4 e 1/8 da carga unitária. Para ampliar o número de dispositivos em uma rede RS485 para 256, uma solução possível é utilizar apenas dispositivos com 1/8 da carga unitária. Os equipamentos da NOVUS Automation utilizam drivers de 1/8 de carga desde 2008. Como em muitas aplicações há também aparelhos não fabricados pela NOVUS no barramento, o cálculo teórico do número máximo de dispositivos na RS485 rede pode ser mais difícil.
Em aplicações menores, onde o comprimento dos cabos da rede é curto e/ou a velocidade de comunicação é baixa, pode ser possível eliminar os resistores de terminação. Isto permite aumentar a capacidade de dispositivos da rede de 32 para 282 dispositivos! Desta forma, É uma operação confiável, nestas condição, não é garantida.
Por fim, para usuários do protocolo Modbus RTU sobre o barramento RS485, deve-se salientar que um eventual aumento no número de dispositivos físicos na rede RS485 poderá esbarrar no limite lógico de escravos do Modbus RTU, que é de 247.
Por ser um dispositivo dedicado ao protocolo Modbus RTU, o gateway AirGate-Modbus assegura o não fracionamento de pacotes Modbus RTU, o que garante sua não deterioração na transmissão sem fio. Este dispositivo ainda realiza a verificação prévia dos pacotes Modbus, não transmitindo pacotes que contenham erros, o que contribui para a minimização do tráfego na rede.
Aplicações típicas do gateway Modbus para redes sem fio
Os dispositivos gateway AirGate-Modbus são aplicáveis na simples eliminação de cabos em sistemas já instalados, em novos projetos ou ampliações de sistemas de automação industrial que requeiram funcionalidades mais avançadas, como multiplexação de mestres Modbus, múltiplos segmentos de rede cabeada interligados por wireless e uso de repetidores para ampliação de alcance. Algumas destas aplicações são ilustradas a seguir.
1. Inclusão de segmentos sem fio em rede cabeada já existente
Em sistemas onde já existe uma rede Modbus RTU operando em RS-485 é possível incluir cobertura sem fio para comunicação com outros segmentos cabeados. Este tipo de situação é típica em expansões de rede onde a instalação de novos cabos é difícil ou não desejável. A inclusão de um gateway em qualquer ponto da rede já existente e de outros gateways em qualquer ponto dos novos segmentos cabeados permitirá a comunicação plena como se fosse uma rede Modbus RTU única. A Figura 1 ilustra esta aplicação.
2. Conexão direta do gateway à porta USB do PC SCADA
Em aplicações de supervisão baseadas em computadores PC, o gateway pode ser conectado diretamente à interface USB do computador, realizando simultaneamente a conversão desta para RS-485 e IEEE 802.15.4. Da interface RS-485 do gateway pode partir a rede cabeada para comunicação com os escravos Modbus RTU. Outros gateways instalados dentro do alcance do primeiro permitem a comunicação sem fio com outras redes cabeadas ligadas a eles, conforme ilustra a Figura 2.
3. Uso do gateway para multiplexar dois mestres na rede sem fio
O protocolo Modbus RTU define que a rede pode ter apenas um mestre, o que impõe restrições técnicas em várias aplicações de supervisão. O AirGate-Modbus aceita a conexão de 2 mestres, um na interface USB (tipicamente um PC) e outro na interface RS-485 (tipicamente uma IHM ou CLP). As requisições de comunicação destes 2 mestres são controladas pelo gateway e enviadas alternadamente para os escravos através da interface IEEE 802.15.4, sendo as respostas recebidas retornadas ao mestre correto. A Figura 3 ilustra esta aplicação.
4. Uso de gateways adicionais para ampliar alcance de redes sem fio
Para ampliar o alcance da rede sem fio, podem ser instalados gateways adicionais, que irão formar sub redes sem fio adicionais, em uma estrutura tipo árvore, conforme ilustra a Figura 4.
5. Função Repetidor com aplicação estrela
Diferentes topologias de rede wireless poderão ser formadas com o AirGate-Modbus. Ao atualizar o AirGate-Modbus através de sua interface USB, utilizando o software de configuração DigiConfig, os equipamentos que estiverem configurados como RS485-Slaves automaticamente se adaptarão aos requisitos da rede. Quando neste modo de operação, o AirGate-Modbus passará a desempenhar a função de repetidor sem fio, uma vez que encontre a necessidade de estender a rede wireless a qual este esteja integrado. É importante salientar que esta função é habilitada instantaneamente quando o equipamento for configurado como RS485-Slaves, sem a necessidade de nenhuma configuração extra.
Como exemplificado na figura abaixo, para expandir a rede, um AirGate-Modbus configurado como RS485 SLAVES (Firmware > 1.23) foi inserido com a mesma PAN ID (5670). Em outro segmento foram conectados dois AirGates através de suas interfaces RS485, um AirGate-Modbus operando no modo RS485-SLAVES a um AirGate-Modbus operando no modo RS485-MASTER. Neste segmento uma nova PAN ID (5671) foi criada, iniciando uma nova rede estrela.
O protocolo Modbus RTU, com sua grande e crescente base instalada, pode se beneficiar da tecnologia de comunicação sem fio, desde que sejam tomados cuidados técnicos para evitar o excesso de erros de comunicação. O uso de conversores genéricos para comunicação Modbus RTU sobre radiofrequência pode elevar a taxa de erros de comunicação, sendo mais adequada a adoção de dispositivos que considerem as características peculiares deste protocolo durante o processo de conversão.
O dispositivo AirGate-Modbus é dedicado a este tipo de conversão, mas possui funcionalidades ainda maiores, caracterizando-se como um gateway de comunicação, permitindo desde a simples eliminação de cabos até funcionalidades complexas como a multiplexação de mestres Modbus e estruturação de múltiplas redes, cabeadas e não cabeadas. Os exemplos de aplicação apresentados permitem vislumbrar as possibilidades que a tecnologia sem fio oferece ao difundido e consolidado protocolo Modbus.
Referências:
IEEE Std 802.15.4™-2003, IEEE Standard for Information Technology – Telecommunications and information exchange between systems – Local and metropolitan area networks – Specific Requirements – Part 15.4: Wireless Medium Access Control (MAC) and Physical Layer (PHY) Specifications for Low-Rate Wireless Personal Area Networks (LR-WPANs).